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Aula 3

*Obs. O cálculo involvendo integrais, usado nesta seção, não será cobrado na primeira avaliação.

1-  A Luz e a Teoria Quântica (O corpo negro)

   Os dois aspectos mais importantes da revolução científica que chocoram o mundo da física, no início do século XX, foram, primeiramente a teoria da relatividade de Einstein, e o segundo, a teoria quântica. A revolução da teoria quântica necessitou de aproximadamente três décadas e a contribuição de vários cientistas para torná-la concreta. Os primeiros passos nesta direção, foram dados por Planck (1900), a partir dos seus estudos sobre o corpo negro, os quais culminaram no desenvolvimento da mecânica quântica de Schrödinger e Heisenberg.

    Um dos fenômenos mais intrigantes estudados no final do século XIX era o da distribuição espectral da radiação do corpo negro. Um corpo negro é um sistema ideal que absorve toda a radiação que nele incide. Na prática ele pode ser materializado por uma cavidade com uma abertura muita pequena, como por exemplo os fornos de uma indústria siderúrgica. As características da radiação desta cavidade dependem somente da temperatura das paredes do radiador.
    Nas temperaturas ordinárias (abaixo de 600oC), a radiação térmica emitida por um corpo negro não é visível, pois a energia está concentrada na região do infravermelho do espectro eletromagnético. Quando o corpo negro é aquecido a quantidade de energia irradiada aumenta com a quarta potência da temperatura e a concentração de energia se desloca para os comprimentos de ondas menores. No gráfico abaixo, as concentrações são representadas pelos máximos das curvas e a quantidade de energia irradiada é dada pela área sobre cada uma das curvas abaixo.

 
Fig. 1 - Radiância espectral de um radiador de cavidades ou corpo negro

    A Fig.1 mostra a potência irradiada por um corpo negro, neste caso um forno de uma indústria siderúrgica, em função do comprimento de onda, para três temperaturas diferentes. Os resultados experimentais relacionados ao espectro de emissão, não foram entendidos na época e, conseqüentemente, não havia modelos teóricos para a sua descrição.
 

1.1 -  Lei de Stefan-Boltzmann

    Com a realização de experimentos com o corpo negro constatou-se que a radiância da cavidade (u) varia com a quarta potência da temperatura do radiador e que a radiação é tanto maior quanto mais quente for o corpo. Esta relação ficou conhecida como lei de Stefan-Boltzmann, isto é, a energia total que emerge do orifício da cavidade é dada pela integral da curva experimental, mostrada na Fig.1,

                                           (1)

onde s é constante de Boltzmann, T é a temperatura, n é a freqüência e un é a densidade de energia espectral. De acordo com o cálculo  integral a equação (1) fornece a área sobre a curva un. Uma das preocupações da época era de se encontrar uma modelo teórico que explicasse os resultados experimentais obtidos para o corpo negro e, conseqüentemente, encontrar a função un em termos do comprimento de onda e da temperatura. Stefan foi um dois primeiros pesquisadores a propor uma solução para este caso, assumindo que a função un deveria variar com o cubo da freqüência, como na expressão a seguir,

                                           (2)

Com isto, Stefan postulava que a densidade de energia fosse função da freqüência (n ) da radiação emitida. Fazendo algumas mudanças de variáveis nas duas equações acima, pode-se facilmente verificar que a equação (2) satisfaz a lei de Stefan-Boltzmann (eq.1). Isto é, seja

       (3)
Substituindo estas resultados na equação integral acima (eq.1) e usando as propriedades de integração de funções, pode-se mostrar que;
                (4)

onde a integral é a constante de proporcionalidade que aparece na lei de Stefan-Boltzmann. Lembre-se que o cálculo integral está sendo usado nesta seção apenas para mostrar como as leis do corpo negro foram obtidas.
        A explicação teórica dos resultados experimentais e a compreensão dos efeitos envolvidos com a radiação de cavidades foram os problemas insolúveis mais importantes durante os anos que precederam o século XX. Vários físicos propuseram diversas teorias baseadas na Física Clássica, as quais, no entanto, tiveram apenas sucesso limitado.
        Um das questões teóricas da época, mais importantes, girava em torno da determinação explícita da função F que aparece na lei de Stefan (eq.2). Várias propostas foram feitas sem sucesso. A seguir discutiremos duas entre as mais importantes propostas, as quais referenciamos como a lei Wien e a lei de Rayleigh-Jeans, e no final da seção, apresentaremos a proposta mais realista para a descrição do comportamento de radiação em corpo negro dada por Planck.
 

1.2 - Lei de Wien

    Avançando um passo na direção da proposta de Stefan, W. Wien encontrou a lei do deslocamento (1893) que tem o seu nome e que enuncia que a distribuição espectral da densidade de energia é dada por uma equação da forma

                                       (5)

        Deve-se notar que a lei de Wien inclui a lei de Stefan, já que ela depende da freqüência ao cubo. A razão da denominação lei do deslocamento é que verificou-se experimentalmente que a intensidade da radiação emitida por um corpo incandescente, mantido a determinada temperatura, representado graficamente, em função do comprimento de onda, por uma curva da forma indicada na Fig.1. Para ondas curtas, assim como para ondas muito longas, a intensidade é infinitamente pequena, por isso, tem-se um valor máximo para determinado comprimento de onda. Variando a temperatura do corpo radiante, o gráfico da intensidade também varia; em particular, a posição do máximo é desviada. Verificou-se desta maneira, pelas medições realizadas, que o produto da temperatura pelo comprimento de onda é constante, para o correspondente máximo de intensidade; ou

l máximoT = constante                               (6)

        Esta relação explica-se imediatamente pela a lei de Wien. Referimo-nos até agora à distribuição da energia em função da freqüência n , representando por un a energia da radiação no intervalo de freqüência dn .  A conversão de un em ul é fácil: deverá ser evidentemente un dn = ul dl ; e como ln = c, a relação entre dn e dl ser |dn |/n = |dl |/l . Daí tira-se que a distribuição espectral da energia, expressa em função do comprimento de onda, é igual a

     .                                 (7)

Observou-se, também, que a lei de Wien está em concordância com os resultados experimentais apenas no caso de comprimento de ondas pequenos (ou freqüências altas). Isto nos leva a concluir que a teoria proposta por Wien falha para grandes comprimentos de onda.
 

1.3  - Lei de Rayleigh-Jeans

    Paralelamente, dois outros pesquisadores (Rayleigh e Jeans) desenvolveram uma nova teoria na tentativa de explicar os fenômenos experimentais relativos ao corpo negro. De acordo com as teorias da época a termodinâmica, por si só, nada tinha a dizer sobre a função F proposta por Stefan e, para determiná-la, os cientistas concordavam que era preciso recorrer a representações especiais por meio de modelos. No entanto, era evidente por considerações do domínio da termodinâmica que a forma da lei dada pela função F deve ser independente do mecanismo especial usado no modelo. O exemplo mais simples de um corpo radiante é o oscilador harmônico linear de freqüência própria n. Para este oscilador podemos determinar a energia radiada por segundo, sendo esta radiação equivalente a aquela emitida por um dipolo oscilante, a qual é dada pela seguinte relação matemática.

                                                     (8)

onde  é a energia média dos osciladores. Pela a lei da equipartição na física estatística, a energia média dos osciladores pode ser expressa por

                                                      (9)
Nesta usa-se a integral para calcular o valor médio das energias dos osciladores, pois supõe-se que eles emitem energia no espectro contínuo. Usando algumas relações matemáticas, podemos calcular o valor da energia média como a seguir,
        (10)
então,
            (11)

e, conseqüentemente,

                                                                    (12)
onde k é a constante de Boltzmann e T a temperatura. Substituindo o valor da energia média na equação para un  obtém-se
                              (13)
a qual é denominada de lei de Rayleigh-Jeans.
    Quando comparamos os valores para un dados pela equação acima com os resultados experimentais, observamos também que eles não concordam para toda região do espectro eletromagnético, conseqüentemente a lei de Jeans é apenas parcialmente válida. Veja os gráficos da Fig.2. Nota-se, então, que a função un encontrada por Rayleigh-Jeans, só explica uma parte dos espectros de emissão dos radiadores, exatamente na região de grandes comprimentos de onda ou baixa freqüência.
    É importante ressaltar que a lei de Rayleigh-Jeans descreve o comportamento dos radiadores exatamente na região oposta do espectro de emissão descrita pela lei de Wien. Isto é, a lei de Wien concorda com o experimento na região de baixo comprimento de onda e a de Rayleigh-Jeans na região grande comprimento de onda. Podemos dizer que elas quase se completam. Veja Fig.2.
 

1.4 - Lei de Planck

           Para resolver este problema e completar a teoria, Planck postulou que a energia emitida por cada oscilador harmônico deveria se dar em pacotes denominados quantuns. Com isto ele quis dizer que a energia de cada pacote era igual a um número inteiro de um dado valor mínimo de energia, isto é e = neo, sendo um número inteiro, n=1,2,3…. Matematicamente isto significa substituir a soma contínua na equação de Rayleigh-Jeans por uma soma discreta, como mostrada a seguir

         (14)
Sabendo que
                                              (15)
a equação acima pode ser escrita por
                 (15)
Conseqüentemente, temos que
                           (16)

Substituindo este resultado na equação da lei de Rayleigh-Jeans obtem-se a expressão de Planck para a radiação emitida no corpo negro,

                                                (17)
Esta equação é denominada lei de Planck. Com esta hipótese, Planck conseguiu um modelo teórico que reproduzisse de forma mais realista os resultados experimentais, no caso da radiação do corpo negro.


Fig.2  - Esta figura mostra, a que região do espectro de emissão onde as
leis de Wien e Rayleigh-Jeans concordam com a lei de Planck.

        Um outro fato interessante na lei de Planck é que ela contém as leis de Wien e Rayleigh-Jeans como caso particular. Estas afirmações a seguir. No sentido de completar a hipótese de Planck foi necessário assumir que a energia de cada radiador fosse proporcional à freqüência emitida, isto é eo= h n . Dessa forma, a equação de Planck assume a forma;

                               (18)
Com isto, pode-se mostrar matematicamente, sob dadas condições, que a lei de Planck é uma caso mais geral do que as anteriores.
 

1.5-  Caso da lei de Wien

Para freqüências altas (hn >>kT) , região de validade da lei de Wien, temos que o fator exponencial é grande comparado com 1, assim, em primeira aproximação:

e que conduz ao seguinte resultado,
                     (19)

Este resultado é exatamente igual ao obtido na hipótese de Wien.
 

1.6-  Caso da lei de Rayleigh-Jeans

A validade da lei de Rayleigh-Jeans se dá na região de freqüências baixas, isto é (hn << kT). Dessa forma pode-se expandir o termo,

                (20)

Substituindo-se este resultado na equação de Planck tem-se:

                                  (21)
a qual é exatamente a lei de Rayleigh-Jeans.
    Em suma, pode-se dizer que o ponto chave na hipótese de Planck foi assumir que os osciladores, nos radiadores do tipo corpo negro, emitem energia quantizada e que um quantum ou a porção mínima é proporcional à freqüência da energia da radiação. O valor da constante h, conhecida como constante de Planck, é, nos dias de hoje igual a
h = 6,626x10-34J.s = 4,136x10-15eV.s
    Planck não foi capaz de enquadrar a sua constante h no esquema da física clássica. A importância fundamental da sua hipótese sobre a quantização da energia não foi valorizada até que Einstein (1905) aplicou idéias semelhantes para explicar o efeito fotoelétrico. Para isto, ele sugeriu que a quantização era uma propriedade fundamental da radiação eletromagnética.
            Este foi o passo mais importante para o desenvolvimento da física moderna ou a teoria quântica.
 
 
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Last Updated: Jan/23/2002
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